Artigo: Sua majestade o sofá

Por: José Alberto Vasconcellos

27/04/2019 06h – DN

Sofá. “SOFÁ, s.m. (do árabe suffa). Assento estofado, com braços e encosto, para duas ou mais pessoas, geralmente usado em salas de estar.” Como se confere, o sofá cujo nome origina-se do árabe, seguramente quem o inventou, para uso em palácios ocupados por árabes de alta patente, porque os árabes de vida simples, sem uma chancela que o distancie dos beduínos, preferem mesmo é sentarem-se no chão.

Anote que o chão das tendas no deserto hoje é mais seguro, que as casas nas cidades que – com sofá ou sem sofá – são constantemente destruídas por guerras ou pelo ataque de terroristas.

Os terroristas apresentam-se em duas categorias: os suicidas e os que preferem ficar vivos, estes acreditando só em parte, na promessa de ir para o harém no céu. Em quaisquer dos dois tipos de ataques, sempre ocorrem grandes estragos materiais (inclusos os sofás) e perdas de vidas de pessoas inocentes, entre ela, crianças e velhos indefesos.

Mas voltemos aos SOFÁS inventados pelos árabes, que é, realmente, o assunto que se pretende abordar nesta crônica. Entre nós, os brasileiros, no seio das classes mais modestas, há uma crença de que o sofá representa “statu social”.

Assim sendo, muitos e muitos brasileiros sonham possuir um sofá. Móvel que vai – imaginam eles – embelezar e valorizar o modesto ambiente da pequena sala, vazia e despida de qualquer conforto. Vai impressionar e propiciar comodidade aos visitantes. Essa a crença!

A vontade de adquirir um sofá é grande; pequenas são as condições financeiras para adquiri-lo; assim sendo, o caminho escolhido é comprar um sofá de segunda mão. É tão grande a vontade de possuir o sofá, que o compram sem examiná-lo com a devida atenção. Compram Carcará como se Peru fosse: o móvel guarda estragos invisíveis decorrentes do uso, que não são detectados pelo comprador no ato do negócio.

Cumprido sua finalidade de propiciar conforto e atestar o “status familiar” de quem o possui, o sofá – inesperadamente – arria! Cai uma perna, rasga o forro, entorta o encosto… em pouco tempo torna-se um traste indecoroso, triste, deprimente e sobretudo vergonhoso, para continuar ocupando o espaço que ocupa na sala, onde são recebidas as visitas.

A família faz conferências analisando a situação do sofá. As mocinhas da família, mais esclarecidas, relacionadas com colegas de melhor e financeiro, têm vergonha de receber as amigas em casa, com aquele sofá na sala, que mais parece uma mula-sem-cabeça semi devorada por um crocodilo. As moçoilas protestam – querem porque querem! – um novo sofá, argüindo, para tanto, que o pai já tem melhores condições financeiras para comprar um novo; ademais, aduzem: as lojas estão vendendo sofás em doze prestações, sem juros!

Pouco tempo depois, o chefe da família, também sentindo-se envergonhado com o tal sofá, resolve comprar um novo. Comprar um novo e fazer o que com o velho? É a pergunta e vem prontamente a solução: a “desova” do trambolho num lixão clandestino.

“Desova” do trambolho é levar e jogar, no silêncio escuro da noite, o “finado” num lixão, o mais próximo de casa. Atestamos esse costume, porque há muito tempo vimos prestando atenção nesses lixões. Em todos eles, sem exceção, sempre há a carcaça de um sofá. É certo, ainda, que muitos lixões contam com mais de um velho e destroçado sofá como enfeite.

Qualquer sofá, por mais sofisticado que seja, um dia quando afrouxa nas suas qualidades, perde a majestade e vai morar numa sala mais modesta ou direto num lixão clandestino, se já entregou todos os pontos, levando consigo estórias e histórias de todas as matizes, verdadeiras, falsas e mentirosas.

Testemunhou o início e o fim de grandes paixões e serviu para consolidar essas paixões como leito, silencioso, cúmplice e servil. Ouviu mentiras e ajustes indecorosos entre políticos. Testemunhou falsidades nascidas da inveja decorrente da pobreza espiritual ou do despreparo para a vida social. Serviu até de morada para ratos e nunca reclamou.

Recebido com festa, gastou sua existência propiciando conforto e “status” para o lar que o acolheu. ou em claro muitos Natais e conviveu com muitas festas de Ano Novo. Serviu como assento para que a mamãe amamentasse seus três filhos, mas… tudo tem um fim: as crianças cresceram, todos envelheceram, e… um dia – sem qualquer cerimônia ou sentimento – foi jogado como um traste inútil, num LIXÃO CLANDESTINO!

Era um móvel doméstico, inventado pelos árabes, que se CONSTITUIA num assento estofado, com braços e encosto para duas ou mais pessoas, usado em salas de estar…

Qualquer sofá abandonado em lixão, teve sua glória e guarda sua história!

22.06.2016 (4778) Membro da Academia Douradense de Letras.

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Artigo: Sua majestade o sofá